Ilustração: Gure
Quando eu morrer, desejo estar errada, abrir os olhos fora de mim e receber o abraço aconchegante de uma boa alma. Quero sentir a textura das nuvens sobre os pés, reencontrar pessoas queridas pelas quais meus olhos derramaram pesadas gotas de saudade. Dizer as coisas não ditas que pensei nunca mais poder dizer.
E até nessa de acreditar em vidas passadas – e principalmente em futuras – eu entrei. Já não consigo explicar de outra maneira essa ligação tão dolorosamente permanente. Quando eu morrer, quero não querer voltar a um mundo sem água e sem amor nem por você.
Quero morar em uma humilde casa, feita dos tijolos que ergui com minhas bondades terrenas. Não precisar trancar as portas e poder admirar, através da janela aberta, as estrelas que passeiam na rua. Acabar me apaixonando por algum desses seres notívagos ou por todos eles.
Quero finalmente escutar ao vivo os ídolos que morreram antes de mim, ainda que isso soe irônico. Ainda que a minha nuvem seja a mais turbulenta e distante.
Quando eu morrer, quero sentir nascer um par de asas furadas. Aprender a voar apesar de tudo. Aprender a cair apesar de tudo.
Quero ser útil a alguém, fazer enxergar quem não pôde admirar as belezas de um mundo imperfeito.
Quando eu morrer, não quero lágrimas. Quero só a dorzinha boa de quem, em algum momento, sorriu por mim. Quando eu morrer, digam que sinto muito e de tanto sentir meu coração parou.
Monique Burigo Marin