CFA

por Monique Burigo Marin às 3:10 PM 9 comentários

   Antes de dormir, sei que tu estás sentado perto de mim, ouvindo o monólogo que acabei de inventar. Sinto o cheiro do café que está em tuas mãos e prevejo um borrão na palavra mais bonita do texto. A luz fraca do abajur lança tua sombra sobre mim e ela me aquece. Ah, como adoro as noites de inverno na tua companhia!
   Tu estás vivo em mim e tens juventude eterna. Não que eu não goste das rugas marcando tuas mãos habilidosas, é só que não te vejo preso nos limites do tempo. É que te quero livre e por perto. É que tenho medo de me empolgar demais e ler todas as páginas de uma só vez.
   Imagino teu riso modesto e teus olhos bondosos. Teu corpo coberto por roupas sutilmente amassadas, do tempo em que era moda usar a calça na altura do umbigo, por isso as tuas ficam onde bem entenderem. Mas, eu sei que o suspensório caído é displicência forjada, pois já te vi organizar até os cigarros. Nem você é perfeito.
   Ainda não estou preparada para conhecer tua verdadeira forma. Prefiro rir da tua mania de não querer o que é necessário. E te escrever como quem escreve para si. E endireitar teus óculos tortos e mandar as vírgulas passearem junto com as colocações pronominais. Prefiro sentir tua presença amenizar o meu medo de fechar os olhos. Só mais cinco minutinhos.

Monique Burigo Marin
 

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