Imagem: Monique Burigo Marin e Wiliam Koester
Não quero dormir, nem conversar. Só quero ficar aqui, quieta, no meu lado da cama, lembrando de que já foi simples sentir a felicidade percorrer meu corpo com seus dedos leves. Era só acreditar, e acreditar também era simples. Acredita?
Ainda me lembro das estratégias da infância. Ao deitar, levava para a cama minha redoma invisível e impenetrável. Protegida por ela, eu deixava as pálpebras esconderem o mundo exterior. Ora, já tinha vivido nele o dia todo, queria agora aproveitar as delícias do meu mundo inventado. Sem interrupções.
A felicidade morava do lado de dentro, facilitava a construção dos sonhos. E se algum pensamento ruim chegasse para ameaçar, sorvete de flocos consertava tudo. Espantava até o calor das noites de verão.
Às vezes minha redoma me levava para passear, adquiria forma de robô e caminhava leve pelos campos. Nas minhas fantasias, tudo levitava. Foi num desses passeios que ultrapassei meus limites, quis tornar o mundo imaginário tangível e pulei para fora da redoma. Então, o robô oxidou e eu fiquei presa do lado de fora.
Hoje estou nua. Sobrevivo. Indefinidamente. Não tenho talento e nem vocação para o perigo, mas sou teimosa, e insisto.
Monique Burigo Marin