O nascer do
sol é uma criança maldosa que nunca envelhece. Nasce rasgando a cortina e o
silêncio. Revela os segredos que eu jamais quis. Ilumina entre os destroços teu
nome: nítido como uma flor no asfalto, resistente como o próprio asfalto. Este inferno é o mesmo todos os dias. O sol
manchando minha pele – e minhas convicções. Rotina. Minha retina exposta encara
minha solidão.
À luz do dia,
revivo teus dedos pesados tocando delicadamente meu rosto. Meus lábios. Minha
alma. Tuas unhas querem distância dos teus dentes, mas a distância não existe. Tua
pele tem o gosto das lágrimas que não derramamos. Teu cabelo é a floresta
escura onde eu me perco. Teus braços oferecem abraços irrecusáveis, abraços que
são como deitar na própria cama depois de anos insone.
Vi tua pupila
crescer junto com a tua necessidade de mim. Mas eu jamais serei tua. Nós jamais
seremos. E antes que eu me entregue, meus dedos leves encontram uma brecha na
tua armadura, perfuram tua pele, removem teus órgãos vitais. Já não sei como
acabar com esta maldita agonia.
Ontem eu fui embora da tua vida, mas cometi o
erro de olhar pra trás. Pra te esquecer, preciso dar sonífero pra essa coisa
que você desperta em mim, cada dia uma dose maior e mais forte.
Monique Burigo Marin