Albinismo

por Monique Burigo Marin às 10:00 PM 8 comentários


O nascer do sol é uma criança maldosa que nunca envelhece. Nasce rasgando a cortina e o silêncio. Revela os segredos que eu jamais quis. Ilumina entre os destroços teu nome: nítido como uma flor no asfalto, resistente como o próprio asfalto.  Este inferno é o mesmo todos os dias. O sol manchando minha pele – e minhas convicções. Rotina. Minha retina exposta encara minha solidão.
À luz do dia, revivo teus dedos pesados tocando delicadamente meu rosto. Meus lábios. Minha alma. Tuas unhas querem distância dos teus dentes, mas a distância não existe. Tua pele tem o gosto das lágrimas que não derramamos. Teu cabelo é a floresta escura onde eu me perco. Teus braços oferecem abraços irrecusáveis, abraços que são como deitar na própria cama depois de anos insone.
Vi tua pupila crescer junto com a tua necessidade de mim. Mas eu jamais serei tua. Nós jamais seremos. E antes que eu me entregue, meus dedos leves encontram uma brecha na tua armadura, perfuram tua pele, removem teus órgãos vitais. Já não sei como acabar com esta maldita agonia.
 Ontem eu fui embora da tua vida, mas cometi o erro de olhar pra trás. Pra te esquecer, preciso dar sonífero pra essa coisa que você desperta em mim, cada dia uma dose maior e mais forte.

Monique Burigo Marin
 

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